quinta-feira, 24 de março de 2011

REVISTA VISÃO: REDESCOBRIR A RAINHA SANTA ISABEL

os pecados da rainha santa isabe“Se quisermos repensar a cultura e encontrarforças vivas no passado, temos que recuar até antes do século XV emPortugal”, diz António Cândido Franco, 54 anos. O seu mais recenteromance histórico debruça-se sobre uma dessas figuras marcantes.

Editado pela Ésquilo, Os Pecados da Rainha Santa Isabel parte da temática da santidade para reflectir sobre a complexa relação entre Isabel de Aragão e a Igreja católica da época.

Licenciado em Filologia Românica pela Faculdade de Letras daUniversidade de Lisboa e doutorado em Literatura Portuguesa pelaUniversidade de Évora, onde actualmente lecciona, António Cândido Francoé autor de uma vasta obra, da poesia ao romance histórico.

JL: Como surgiu o interesse pela Rainha Santa Isabel?
Depois de ter escrito, em 2003, sobre Inês de Castro e, no anopassado, sobre Leonor Teles, apercebi-me de que tinha criado um dípticoformado por duas figuras femininas marcantes da Idade Média portuguesa,e muito próximas cronologicamente. Mas faltava uma terceira, tão oumais importante do que aquelas: Isabel de Aragão, mulher de D. Dinis,que era, por sua vez, avô de D. Pedro e bisavô de D. Fernando. Comecei,então, a pesquisar, e foi de tal forma absorvente que, em 2009,publiquei Vida Ignorada de Leonor Teles e, logo este ano, Os Pecados da Rainha Santa Isabel.

O que têm em comum essas três mulheres?
Em Inês de Castro e Leonor Teles abordei, sobretudo, o tema do amore da paixão, que em Isabel de Aragão não tem tanta importância, apesarda relação com D. Dinis não ser tão fria como se pensa. Não obstante,as três estão ligadas por uma cultura que não é masculina, que não tema ver com afirmação, domínio, imposição. É uma cultura do silêncio,quase sagrada. Além disso, são, curiosamente, identificadas pelo mesmoespaço: Coimbra. Isabel de Aragão funda aí a casa de Santa Clara, ondeInês morre, e Leonor e Fernando vivem grande parte da sua história deamor naquela cidade.

Em relação a Isabel de Aragão, o que pretendeu explorar?
Parti da temática da santidade, incontornável nesta figura. Com ainvestigação histórica, apercebi-me, surpreendentemente, de que aRainha Santa Isabel era marcada por uma heterodoxia face à Igrejainstitucional da época, que já vinha dos seus antecedentes. O pai, D.Pedro III de Aragão, foi excomungado pelo papa Martinho IV, o avô,Manfredo, morreu numa batalha campal contra a hoste do papa da época, eo bisavô, Frederico II, foi considerado como uma espécie de ‘besta doapocalipse’ pela Igreja de Roma. Tudo isto concede a Isabel de Aragãouma tonalidade totalmente inesperada, porque pouco conhecida, e que éum dos seus ingredientes mais atrativos.

Neste romance, o pecado é a heresia…
Sim. Mais concretamente, os aspetos heréticos da espiritualidade deIsabel. O historiador Jaime Cortesão deu um contributo importante paraesta questão, nomeadamente com Os Descobrimentos Portugueses(1960), onde afirma que Isabel de Aragão era uma figura mais complexado que, até então, se pensava, e que a sua ‘riqueza’ passa por essaheresia espiritual. Afinal, a Rainha Santa não só esteve envolvida emlutas acesas com o clero rico e instalado, como também fundou emAlenquer as festas do Espírito Santo, em que o povo, a nobreza e acorte se sentavam à mesma mesa, e os presos eram libertados.

Defende uma perspetiva da História próxima da Lenda. Porquê?
Não é possível fazer História como uma ciência, na medida em que areconstituição dos acontecimentos é sempre um entendimento posteriorrelativo, conforme o ponto de vista daquele que observa ou estuda.Neste sentido, a imaginação, a parábola, a alegoria, a poesia e oromance histórico têm um papel muito importante na reconstituiçãopossível da História, nomeadamente de aspetos que os documentos ou are-elaboração histórica deixaram esquecidos.

Publicado por Rui Monteiro no blogue "Causa Monárquica"

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