segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

TEXTOS DE FERNANDO PESSOA (III)

«Vem o Sr. Afonso Costa… Aquilo é que é uma besta! (…)

É daqueles homens a quem o epíteto ilustre anda sempre atado como uma lata ao rabo dum cão, a pertencer-lhe, tanto como a lata ao cão pertence.

(…) Resta um ponto, e este, quero frisá-lo claramente, para que nenhuma dúvida reste. A minha carta terminava com as frases, que na Capital foram transcritas, sobre o desastre acontecido ao chefe do partido cognominado democrático. Apontou V. Ex.ª à execração pública o autor de semelhante trecho, desapiedado e mau. Peço encarecidamente a V. Ex.ª que me deixe vincar bem o quanto eu, longe de retirar essas frases, mais convictamente e mais ardentemente as apoio e as vinco. O chefe do partido democrático não merece a consideração devida a qualquer vulgar membro da humanidade. Ele colocou-se fora das condições em que se pode ter piedade ou compaixão pelos homens. A sua acção através da sociedade portuguesa tem sido a dum ciclone, devastando, estragando, perturbando tudo, com a diferença, a favor do ciclone, que o ciclone, ao contrário de Costa, não emporcalha e enlameia. Para o responsável máximo do estado de anarquia, de desolação, e de tristeza em que jazem as almas portuguesas, para o sinistro chefe de regimentos de assassinos e de ladrões, não pode haver compaixão que os combatentes leais merecem, que aos homens vulgares é devida. Costa nem sequer tem o relevo intelectual que doure a sua torpeza. A sua figura é a dum sapo que misteriosamente se tornasse fera. Pode ter-se compaixão por aqueles por quem se tem ódio. É impossível a compaixão por aqueles que não podem deixar de inspirar ódio e nojo, conjuntamente. Por isso eu quero frizar – e sei que ao frizá-lo estão comigo os votos de grande número dos portugueses, dos católicos oprimidos, das classes médias atacadas, dos cidadãos pacíficos assaltados nas ruas, de todos aqueles que o General Pimenta de Castro representava – que só não se regozija, no desastre acontecido a Costa, a circunstância, que infelizmente se parece confirmar, do seu restabelecimento. Esse homem – esse homem sem relevo espiritual, sem nobreza de carácter, que nunca teve uma ideia elevada, um gesto generoso, um movimento de ternura – esse homem não pertence ao número daqueles por quem nós podemos sentir humanamente.

Não podendo (Afonso Costa) fazer mais nada, é homem para mandar assassinar. Tudo depende do seu grau de indignação.» 

LAÇOS DE FAMÍLIA: UM BOM REI

Revista Magazine Grande informação de Dezembro de 2006
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domingo, 27 de fevereiro de 2011

PARA QUEM AINDA NÃO VIU, A NÃO PERDER!

ANTÓNIO BARRETO, O CONVERTIDO

Fonte: Jornal "O Diabo"

UM PEQUENO ALMOÇO DE PRIMOS NA YORK HOUSE, EM LISBOA

 
Encontra-se de passagem por Lisboa, S.A.I.R., Dom Bertrand de Orleans e Bragança, Príncipe Imperial do Brasil. É o terceiro dos doze filhos do Príncipe Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança.
 
A Família Imperial do Brasil descende da filha mais velha do último Imperador do Brasil, Dom Pedro II (filho de Dom Pedro IV de Portugal e I do Brasil. Foi casada com Dom Gastão d'Orleans, neto de Luís Filipe, Rei dos franceses. Era avó de S.A.R., Dona Maria Francisca, mãe de S.A.R., Dom Duarte Pio de Bragança.
 
Facebook - 27-02-2012

SONHOS E REALIDADES NA REVOLTA ÁRABE

A situação política nos países árabes da margem sul do mediterrâneo é explosiva: para os seus governos, quase todos ditaduras, para os seus povos, que sofrem uma nova onda de violência da repressão, para o equilíbrio geo-estratégico da região, já anteriormente periclitante, para Israel que se vê cada vez mais isolado e ameaçado, para a Europa e os EUA, uns vizinhos, outros aliados de regimes que agora se desmoronam como baralho de cartas, desde sempre viciadas.
Na Europa, e também nisso somos muito europeus, alguns políticos e a comunicação social praticamente toda, embandeiraram em arco com a revolta dos povos contra os seus governos, dizendo que clamam pela democracia e pela liberdade e que se revêem no modelo ocidental, que lhes vai chegando pela internet, pelas redes sociais e pelos mais modernos meios de comunicação, como os telefones portáteis, que usaram para convocar as manifestações pacíficas que, depois, degeneraram em violentas, depois da violência dos poderes ameaçados no seu combate. Apressada asserção, julgo eu. Esquecem-se ou ignoram ou querem fazer valer os seus ideais e valores sobre a realidade, que o fundamentalismo islâmico está em muitos casos visível por detrás da justa revolta dos povos oprimidos e que sem essa opressão – quer seja de chiitas sobre sunitas, quer seja laica - têm o campo aberto para impor regimes teocráticos. Não aprenderam nada com o derrube da monarquia persa, que não sendo um regime democrático de modelo ocidental era bem mais democrático e ocidental do que o dos ayatollhas que se lhe seguiu, com o aplauso geral e o apoio, mais ou menos disfarçado, de França e EUA.
É evidente que as ditaduras nesses países é, aos meus olhos de democrata ocidental, intolerável. É evidente, também, que o apoio dos países europeus e dos EUA a esses regimes por razões estratégicas e a sua condenação, agora, pelas mesmíssimas razões e na esperança de que o que se lhe seguir não se volte contra eles, é igualmente intolerável. Como também é intolerável que se não procure ver e compreender que, neste caso concreto, como noutros de outras latitudes, o modelo de democracia ocidental não é exportável para aplicação imediata, que há que contar com a cultura dos seus povos, com o percurso histórico que, devido a vários factores, entre os quais os religiosos, têm vindo a percorrer e que querer impor um modelo político – por mais desejável que aos nossos olhos seja – é um erro crasso que custará ao Ocidente mais do que muitos, porque irrealistas, poderão supor.
É curioso, nesta revolta que grassa nos países árabes, constatar que todas essas abomináveis ditaduras substituíram monarquias com o beneplácito ocidental, em nome da liberdade que nunca veio a existir depois e que, nas monarquias árabes, com excepção do Barhein e da Arábia Saudita (onde ainda não se registaram movimentos de revolta) e que são monarquias absolutas, as reivindicações não tiveram como objecto os regimes, mas os governos e as suas políticas, salvaguardando a figura dos seus reis. Se o Ocidente não quiser meter a cabeça na areia, especialmente os EUA que sempre apoiaram o derrube das monarquias com a única excepção do Japão e que é na Ásia a única democracia moderna, e não conseguir perceber o seu significado, esperemos que em nome da utopia não assistamos ao fim das monarquias jordana e marroquina e ao início de regimes teocráticos islâmicos, sem liberdade e uma terrível ameaça para o Ocidente e sobretudo para a Europa aqui tão perto.
Confundir os desejos e as ideologias – por mais belos e justos que possam parecer – com as realidades, é um erro que se paga caro.

João Mattos e Silva in Diário Digital (23-Fev-2011)

A REPÚBLICA EXPLICADA ÀS CRIANÇAS

A monarquia é uma forma de regime em que o chefe de Estado é um rei ou uma rainha. Ao contrário do regime republicano, o rei não é eleito, e a representação do país está numa pessoa cujos antepassados participaram na construção e na História do país. Por isso não são estranhos ao povo e como os príncipes criados para reinar não precisam de ter uma carreira política, conhecemo-los desde a infância, até à idade adulta, quando assumem o cargo de Chefe de Estado.

Já viste o que seria se tivesses de escolher os teus pais, ou os teus pais dissessem: eu tenho o direito a escolher o filho que quero? Passa-se o mesmo em República. O nosso Chefe de Estado, em vez de ser alguém que conhecemos e gostamos desde pequenino, é apenas um político que quer um emprego. Representa o país durante 5 ou 10 anos e depois vai-se embora...

A nossa monarquia durou 771 anos como sabes, pois em 1910 um golpe de estado expulsou o rei D. Manuel II, a sua mãe e a sua avó para fora do país. Isso foi bom ou foi mau? Deve caber a ti estudares para compreenderes as alterações dessa época, mas gostava de te explicar que a República instaurada em 5 de Outubro de 1910 não veio trazer a democracia a Portugal. Nessa altura o nosso país já tinha liberdade. As pessoas podiam votar e a Imprensa publicava todas as críticas que queria.

Ao contrário do que a propaganda republicana tem dito, a democracia foi introduzida em Portugal em 1834, suspensa algumas vezes até 1926  e neste ano definitivamente implantada o que deu origem a uma das mais longas ditaduras de sempre, em todo o mundo! Foi o Estado Novo ou Segunda República, que durou de 1933 até 1974! Neste ano a Democracia voltou a Portugal, pela Revolução de 25 de Abril, como decerto já ouviste falar.

Em 771 anos tivemos 33 monarcas, o que perfaz uma média de cerca de 22 anos por reinado. Compreendes a importância desta estabilidade? Em 100 anos de República, de 1910 a 2010 tivemos 19 presidentes, o que se traduz numa média de 5 anos por mandato...  alguns deles conflituosos, pois o presidente procura fazer os possíveis para agradar aos eleitores e ao partido ou partidos que o apoiam. Não está ali simplesmente para representar o país, mas para se representar a si mesmo e a quem vota nele...

Também tivemos algumas rainhas e regentes, mais ainda não tivemos nenhuma mulher presidente da República!

Mas, então, perguntarás, se a monarquia tinha vantagens, porque terminou? Bem, como tens visto na televisão, em relação às revoluções no estrangeiro, nem sempre estas revoluções são populares. Muitas vezes, um grupo pequeno, bem relacionado e que recorra à violência pode derrubar regimes. Foi o que aconteceu em Portugal. Os republicanos estavam em menor número, mas:

- aproveitaram-se do desgaste partidário, ocasionado pela alternância constante entre 2 partidos no poder;

- aproveitaram-se das ideias nacionalistas de pátria e de herói para fazer passar a sua mensagem;

- fizeram ataques ferozes ao Rei D. Carlos e à sua família, espalhando boatos e criando uma imagem negativa da monarquia que diziam despesista e ostensiva;

- recorreram à violência através de uma organização terrorista e chamada Carbonária que assassinou o Rei e o seu filho, de 21 anos, D. Luís Filipe, em 1908 (foi o Regicídio) e através de uma organização secreta que ainda hoje existe, a Maçonaria, conseguiram controlar o exército e alguns políticos;

-e, finalmente, como o país, infelizmente, ainda era constituído essencialmente por pessoas iletradas, culturalmente pouco informadas, facilmente o Partido Republicano pode controlar os cidadãos, com mensagens demagógicas e inflamadas. (É por isso que deves estudar e questionar tudo para seres um adulto com consciência cívica!)

Depois de instaurada a República, sucederam-se imensos atropelos à liberdade que o novo regime tinha prometido. Pessoas foram perseguidas por serem católicas, monárquicas ou simplesmente por não colaborarem com o novo regime. E os próprios republicanos lutaram entre si para conquistar e aguentar o poder. Em 1914 a república levou milhares de jovens a entrar na I Grande Guerra. Muitos morreram e o país desmoralizava perante uma crise económica, social e política. Todos os dias havia atentados em Lisboa, o governo caía, os presidentes demitiam-se ou eram demitidos por golpes de estado. Entre 1911 e 1926 houve quase 50 governos!

Porém, a monarquia sempre foi uma alternativa democrática em Portugal, tanto durante a Primeira República, como durante o Estado Novo e mesmo hoje.

A Europa, como deves saber é praticamente constituída por Monarquias Constitucionais, como Portugal o era antes de 1910. Monarquias Constitucionais e (ou) Parlamentares são aquelas em que o rei não governa (para isso existe o Primeiro-Ministro e o seu Conselho de Ministros que nós elegemos), cabendo-lhe apenas a representação e a regulação das instituições do seu país. Por isso países desenvolvidos como a Noruega, Suécia, Dinamarca, Holanda, Bélgica, Luxemburgo, e aqui ao lado Espanha são monarquias. E fora da Europa encontramos muitas mais: Japão, Marrocos, Jordânia, etc. o Reino Unido, por exemplo, e a Comonwealth que estende pelo Canadá e pela Austrália, entre outros países, cuja chefe de Estado é a rainha Isabel II.

Não há regimes perfeitos. Nem pessoas. Acima de tudo deves procurar saber o que melhor serve a tua nação e pensar por ti. Não grites Viva a República! sem perguntares a quem to manda fazer, se existe uma alternativa e se essa alternativa é melhor ou pior. Acima de tudo sê um cidadão informado pois só assim podes construir um país melhor e contribuir para um futuro mais sorridente a quem viver em Portugal nos próximos anos. E que estes anos sejam mais pacíficos e prósperos do que foram os últimos 100. 

Nuno Resende
Fonte: Obliviário

sábado, 26 de fevereiro de 2011

"UMA QUESTÃO FALSEADA" POR MÁRIO SARAIVA (*)


A temática política do século XIX, muito nefasta em vários aspectos, inventou o antagonismo, Monarquia-República, tão infundamentado como pernicioso, e que a incompreensão contemporânea ainda vem a sustentar. Ilusório antagonismo que talvez só por si tenha sido o causador de dramáticos acontecimentos na vida nacional.
Em rigor, Monarquia e República não têm significados opostos e nem sequer são inconciliáveis. De acordo com os conceitos tradicionais, precisamente a República existia dentro da Monarquia; fazia parte dela.
República (Res publica - a Coisa pública - a Coisa do Povo) tem um sentido definido que a etimologia própria e o seu uso histórico não permitem confundir. Apenas que a República tinha então por regedor e defensor um Monarca. Lembremo-lo no caso de algumas demonstrativas citações.
Na Crónica del-Rei D. Fernando diz Duarte Nunes de Leão: «... em cortes q para isso ajuntou fez algüas leis mui utiles aa republica, & naquelles tempos mui necessárias.»
Damião de Góis põe na voz de D. Afonso V, ao armar cavaleiro seu filho D. João após a conquista de Arzila, as seguintes palavras: «... he bem q saibais q cavallaria há virtude misturada cõ poder hõrroso, segundo natureza mui necessário pera cõ elle poer paz na terra, quãdo cobiça ou tyrania, com desejo de regnar, inquietã hos Regnos, respublicas & pessoas particulares.»
O próprio D. João II, numa notável carta ao rei de França, abria-a com estas judiciosas considerações: «obrigação é do bom Príncipe e prudente, não somente galardoar seus vassalos com honras, cargos e dignidades merecidas, mas castigar com rigor, severidade e justiça aos que são prejudiciais em sua república, para que os bons com o exemplo do prémio sejam melhores e os maus ou com castigo se emendem, ou com as maldades pereçam.»
Nos Apontamentos dos Prelados tomados um ano depois das Cortes de 1582, expunha-se: «Porque he em tão grande damno deste Reyno, e prejuizo da Republica fazerem-se tantas uniões, annexações, desmembrações perpetuas como se fazem,. ..»
D. Sebastião escreveu numa das Máximas que traçou para orientação do seu reinado: «Gavar os homens, e cavalleiros que tiveram bons procedimentos, diante de gente, e os que tiverem préstimo para a República e mostrar aborrecimento às cousas a ella prejudicaes.»
Em Junho de 1580 a Faculdade de Teologia de Alcalá, consultada por Filipe II sobre a sucessão ao trono de Portugal, pronunciava-se nos seguintes termos: «si alguno opusiesse que la republica de Portugal és perfecta. ..»
Na Justa Aclamação exarou o Doutor Vaz de Gouveia: «O poder dos reis está originariamente nos povos e nas repúblicas, que delas o recebem por forma imediata.»
Depois da Restauração é, por exemplo, D. Luísa de Gusmão, regente, a usar a costumada forma: «Hei por serviço ,de Deus e meu, e beneficio da Republica.»
Julgamos desnecessário alongar, através dos tempos, as citações comprovativas.
A quem tenha lido alguns textos da história a palavra República não choca os sentimentos realistas que possua, antes surpreende que esta se tenha arvorado em contraposição ao de Monarquia, e que não houvesse protesto contra tal equívoco antes de ele começar a fazer carreira.
Aí pelos anos vinte António Sardinha ainda achou oportunidade de afirmar: «o adjectivo republicano pode caber-nos, na verdade, desde que lhe precisemos o sentido.» Igual ,pensamento exprimira Maurras: «a palavra República tem um sentido razoável, mesmo depois do restabelecimento da Monarquia ela poderá continuar a usar-se na interpretação que indicava o âmbito dos negócios públicos.»
Mais nos nossos dias depõe o mestre integralista há pouco falecido - Pequito Rebello: «Chame a República o Rei e com isso não se suicide! Porque - e por Deus atentai que isto é uma verdade profunda - a Monarquia é também uma República. Quero eu dizer que na Monarquia, além do seu automatismo que naturalmente assegura o interesse nacional pelo órgão dinástico - e no que é propriamente Monarquia - pode nela também haver o livre esforço cívico de cada um dos portugueses para aperfeiçoar ao máximo a vida social no sentido do bem comum.»
Pequito Rebello termina assim o seu apelo: «Essa Monarquia nova seria o verdadeiro Portugal. E continuaria sempre a presidir-lhe o lema antigo: Glória de Deus! Serviço do Rei! Bem da República!»
Concluindo podemos assentar em que a diferença entre um soi-disant republicano e um de nós é fundamentalmente esta: ele quer para a República um Presidente periodicamente eleito; nós queremos que a República remate pela chefatura dinástica de um Rei.
Não cabem aqui os argumentos de uma e de outra opção, e talvez até sejam dispensáveis ante a desastrosa experiência de mais esta desordenada e conturbada República de Presidentes, que arruina o país, depois de ter desfeito a Nação.
Do Governo da República pelo Rei é o título feliz e sugestivo de um livro escrito em 1496, dedicado ao futuro D. Manuel I. Pensemos no que este título diz e fiquemos nisto: à República Portuguesa todos pertencemos hoje, como pertenceram os nossos antepassados no antigo reino de Portugal. Simplesmente uns são presidentistas, enquanto que nós outros somos realistas.
Mas precisemos um pouco as ideias.
Se o ofício real é, sobretudo, o de reger e coordenar a administração da República em vista ao bem comum em harmonia social, tal função pressupõe uma república ordenada e orientada nesse mesmo sentido do interesse da comunidade nacional. República não corresponde obrigatoriamente a democratismo.
É de excluir, portanto, a hipótese de um género de regime republicano desordenado, conflituoso e desastroso como o de 1910-26, ou como o actual, legítimo sucessor e cópia fiel daquele.
Tendo estas duas Repúblicas como fundamento o exclusivismo partidocrático originário de uma luta constante, inspirada pode dizer-se que apenas pela ambição do Poder, e resultante numa instabilidade governativa impeditiva de um bom governo, não se coadunariam com a função da Realeza.
Há-de ver-se também que o exercício da Realeza se não conforma com um regime autocrático como o foi o da 2ª República.
O Rei é por dever e por conveniência própria - isto é muito importante - o garante das liberdades do seu Povo. Daí que não possa tolerar autocracias sempre negadoras dessas liberdades populares. E dizemos liberdades populares, mas não arruaceiras, criminosas, ilegais. Mas sim liberdades do Povo organizado através das suas associações representativas, que são os organismos vitais da sociedade, isto é numa representação autêntica do país que trabalha, que pensa, que quer a tranquilidade justa e necessária ao progresso e ao bem-estar de todos. É aí que se encontra o lugar dos «Corpos Intermédios» que são o meio de defesa das pessoas perante os órgãos superiores do Estado.
Como a República, para merecer o adjectivo de nacional, não pode limitar-se a olhar só ao presente, mas tem de prover ao futuro, só pode encontrar no Rei dinástico, dada a vitaliciedade de funções e a sucessão hereditária, a chefatura coerente.
Diremos que para uma má República, qualquer Presidente de facção está conforme; que para uma boa República é o Rei o magistrado indicado, porque alia à chefia do Estado a representação da Nação na sucessão do tempo.
(In Mário Saraiva, Sob o Nevoeiro, Lisboa, 1987)

(*) Mário António Caldas de Mello Saraiva (Guimarães, 12.5.1910- Vilar, Cadaval, 28.5.1998) foi uma personalidade plurifacetada - médico, desportista (tiro), pintor, etc. - vindo a notabilizar-se através de estudos nos domínios sebástico e pessoano, e de uma obra política e doutrinária onde verdadeiramente se iniciou o Neo-Integralismo. 

Mário Saraiva- filhodo Major José Augusto Saraiva, um dos oficiais do Exército compulsivamenteafastado de serviço por ter proclamado a «Monarquia do Norte» (1919) - foi destacadomembro da terceira geração do IntegralismoLusitano

Estudanteem Coimbra, fundou o jornal académico Paracelso, filiando-se, em 1932, noMovimento Nacional-Sindicalista liderado pelos integralistas Albertode Monsaraz e Francisco Rolão Preto. Depois daquele movimento ter sidoinfiltrado, desmantelado e, por fim, proibido por Salazar, Mário Saraivacontinuou a sua intervenção pública nos inícios dos anos 40, ao lado de MárioCardia que, no Jornal do Médico, fez, pela primeira vez em Portugal, a defesa deum Serviço Nacional de Saúde. 

Aestreia de Mário Saraiva como doutrinador monárquico deu-se em 1944 aopublicar Claro Dilema – Monarquia ou República?. De pronto saudado pelos Mestres integralistas Hipólito Raposo e Alberto de Monsaraz, será no final da década de 50 que se revelará como um dos máximosexpoentes entre as novas gerações daquela escola de pensamento, ao lado de,entre outros, Afonso Botelho, Rivera Martins de Carvalho, António JacintoFerreira, Henrique Barrilaro Ruas

Sem nunca deixar de exercer a profissão médica– pertenceu ao quadro de médicos civis da Força Aérea Portuguesa – Mário Saraivaparticipou activamente na campanha restauracionista de 1951, em torno do jornal O Debate (Lisboa, 1951-1974), vindo a terdestacado desempenho na defesa do ideário integralista lusitano em polémicacom alguns monárquicos apoiantes do salazarismo (A Voz, 1954-55).

Foi no início dos anos 60 que Mário Saraivacomeçou a desbravar os caminhos do Neo-Integralismo.Retirando do mestrado integralista a liçãode que a Monarquia da Carta fora deposta em 1910 porque se tinha transformadonum corpo estranho à Nação, dominada pelos políticos das oligarquias partidárias,Mário Saraiva  pugnava por umareinstauração do Trono a ser realizada no quadro de uma República restaurada,isto é, devolvida às matrizes municipalistas e orgânicas da tradição democráticaportuguesa. Entendendo a República (Res publica) como vivência dedireitos cívicos, de liberdade da Grei nos negócios da suagovernação, de autonomia político-administrativa do País, Mário Saraivaconsiderou que para esta ter um carácter verdadeiramente nacional, se exige uma suprema magistratura tambémnacional - independente na origem, como requisito da imparcialidade e dajustiça, e representativa da totalidade da Grei e da sua continuidade histórica. Apenas no Rei, personificação da Pátria, via Mário Saraiva o Chefe em condiçõesde exercer com independência e isenção a Suprema Magistratura da República,nos domínios Judicial, Diplomático e Militar. Adversário de todas as formas cesaristas de poder, fossem presidencialistas,parlamentares, referendárias ou mistas, para Mário Saraiva a Restauração de Portugal ter-se-ia de fazeratravés de uma Nova Democracia.

AComissão Doutrinária da Causa Monárquica acolheu as suas teses, em 1970, aoadoptar oficialmente a obra Razões Reais. Naquela época, Mário Saraiva ocupava já um lugarde destaque como organizador das actividades em que velhos e novosintegralistas se achavam envolvidos. Fora um dos fundadores da RenovaçãoPortuguesa, e um dos mais destacados impulsionadores da ConvergênciaMonárquica, encontrando-se então na primeira linha da reactivação domovimento editorial monárquico integralista através da “Biblioteca doPensamento Político”, onde Luís de Almeida Braga publicou aquela queficaria como a sua última obra – Espadaao Sol (1969). 

Em 1978,recebeu de D. Duarte Pio João de Bragança a missão deconstituir e secretariar o seu Conselho Privado, cargo que manteve até àsua morte.  

Nosseus últimos anos de intervenção pública, Mário Saraiva veio a revelar-se um prolixo escritorna defesa do ideário monárquico. Apresentando à consideração pública as vantagens da supremamagistratura régia, denunciou o actual preceito constitucional queimpõe o modelo presidentista à Suprema Magistratura da República, ereivindicou o fim do monopólio da representação política por intermédio dospartidos político-ideológicos, tanto nos municípios, como na câmaralegislativa. A par dos seus estudos histórico-literários,fosse nas páginas da Consciência Nacional (que dirigiu), ou em jornais como O Dia, Correio da Manhã, etc.,  ouainda em livros, veio a produzir vasta bibliografia monárquica, parte delatraduzida em francês, espanhol e mesmo em cirílico. ASociedade Histórica da Independência atribuiu oprémio “Livro 1997” à sua obra Apontamentos– História, Literatura, Política


Obrasmais importantes: Claro Dilema,1944; Os Pilares da Democracia, 1949; Coordenadasdo Poder Real, 1961; Razões Reais, 1970; AVerdade e a Mentira,1970; ÀsPortas da Cidade - Crítica e Doutrina,1976; Outra Democracia, 1983; OCaso Clínico de Fernando Pessoa,1990; Em Tempo de Mudança, 1992; Pessoa,Ele Próprio - Novos Estudos Nosológicos e Patográficos,1992; Dom Sebastião na História e na Lenda, 1994;Frontalidade- Ideias, Figuras e Factos,1995; Apontamentos- História, Literatura, Política, 1997; Impressõese Memória, 1998; Ideário, 2000.

JoséManuel Quintas in "Unica Semper Avis"

DOM DUARTE PIO, DUKE OF BRAGANZA, SPONSORS FUNDRAISING TO SUPPORT FLOOD VICTIMS IN BRAZIL


DOM DUARTE PIO, DUKE OF BRAGANZA,
SPONSORS FUNDRAISING TO SUPPORT
FLOOD VICTIMS IN BRAZIL

February 16, 2011  

HRH Dom Duarte Pio II, Duke of Braganza, as President of the King Manuel II Foundation, is sponsoring a fundraising campaign to support the flood victims in Brazil. The purpose is to show the solidarity of the Portuguese people with the flood victims in the State of Rio de Janeiro.

Approximately a month ago, torrents of mud and water set off by heavy rains left a trail of destruction through the mountainous Serrana region near the city of Rio de Janeiro, toppling houses, buckling roads and burying entire families as they slept. The mudslides swept away the homes of rich and poor alike in and around Teresopolis and other towns, likely causing billions of dollars in damage. But the brunt of the disaster was borne by poorer rural residents in houses built in risky areas without formal planning permission. The death toll from Brazil's devastating flooding has topped 800, with hundreds more missing, in the country's deadliest natural disaster on record.  

The King Manuel II Foundation has opened an account (via Caritas Brazil) in order to transfer funds directly to the people in the affected areas in Brazil.

HRH Dom Duarte Pio has in fact stated that "500 years of friendship between Portugal and Brazil cannot leave us indifferent to this tragedy that has stricken our Brazilian brothers and sisters."

DONATION INFORMATION  

Account Information:

Crédito Agrícola - Terras de Viriato
Swift Number: 0045 3080 40241550962 70
Account Number: 40 241550962
Name of account: Apoio às vítimas inundações do Brasil

Contact:

Francisco de Mendia
91 978 03 60
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NOPA is a national non-profit, non-partisan, tax-exempt organization created to address the many growing needs of the Portuguese-American community living in the United States.

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Phone: 703-389-3512

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

HOJE ÀS 17 HORAS: ENCONTRO NO PORTO DO GRUPO DO FACEBOOK: "MONÁRQUICOS PORTUGUESES UNIDOS"


Hora
Sábado, 26 de Fevereiro · 17:00 - 19:00

Local
Porto

Criado por

Mais informação
Praça da Liberdade, Avenida dos Aliados, Junto à estátua de D. Pedro IV

Este encontro não é para arruada!

Podem levar uma bandeira para tirar fotos !

Quem não puder aparecer agradecemos que avise com 24 horas de ante-cedência o Rui Almeida D"Eça Sá
http://www.facebook.com/profile.php?id=100000049286170

ENTREVISTA AO ARQUITETO GONÇALO RIBEIRO TELLES PELO JORNAL DE NEGÓCIOS EM 2009

PhotobucketÉ um monárquico que viveu sob o signo da República.

"Eu não me importo nada de servir a República. Tenho bilhete de identidade, servi, fui deputado". Porém, diz ainda, "quando nos impingem a cidadania, a coisa complica-se... O que é o cidadão?", pergunta. "É ter que servir", responde. Diz que a cidade é a sua vida interior, mas é de assinar a Rede Ecológica Nacional que mais se "vangloria"

(17 de Abril de 2009)




A minha vida interior é a cidade, tudo à volta é a paisagem

É um monárquico que viveu sob o signo da República "Eu não me importo nada de servir a República. Tenho bilhete de identidade, servi, fui deputado".

É um arquitecto que fala de jardins como se falasse do paraíso. "Na Bíblia, quando se fala do jardim, é um lugar concreto, circunscrito. Os hebreus não andavam à procura do jardim, andavam à procura do Éden, o vale fértil onde estava o jardim. Depois vem a casa do Homem. A certa altura a casa do Homem é tão grande que começa a ser necessário o jardim público, o parque, a ligação de parques e de jardins, os espaços verdes. Não chega, porque 84% da população mundial vai viver para as cidades, que ficam desmesuradas, ou então são todas torres, o que é desumano. Temos de criar um Éden para esta cidade, e temos que criar dentro do Éden o paraíso, quê é o jardim". Um idealista? Um realista. Empenhou-me em fazer um mundo mais próximo daquele onde gostaria de viver.

É um homem de outro tempo. Do tempo em que se brincava na Avenida da Liberdade.A cidade era outra "Eu tinha uma tia que morava numa casa que hoje é um hotel de luxo, na Rua de Santa Marta Essa tia não tinha filhos e tinha um sobrinho, que era o meu avô; vendeu o palácio e fez uma casa na Avenida da Liberdade (que já foi abaixo). A minha avó, por sua vez, vinha de uma casa de São Paulo, ao Cais do Sodré; depois de casar, ocupou a casa na Avenida da Liberdade. Trouxe com ela o irmão coxo, que [se instalou] nas águas-furtadas. Vivia sozinho com uma criada, o marido da criada, que era carteiro, e os livros. O resto da família vivia por andares, no prédio; eu vivia no 3°". Visitava-o muito.

Gonçalo Ribeiro Telles é um contador de histórias. Passei uma tarde com ele a ouvir histórias. É esta a sua história

Para o entender, devemos começar por falar do seu tio-avô, Joaquim Cardoso Gonçalves?

Como é que você sabe do meu tio Joaquim? E uma pessoa fundamental na minha vida. Era irmão da minha avó. Uma particularidade: tinha tido uma paralisia infantil e ficou aleijado de um braço e de uma perna. Era uma pessoa com muitas preocupações, e a preocupação menor era ser aleijado. Dedicou uma parte importante da vida aos deficientes. O grande amigo dele era o António Sérgio. Tinha o curso correspondente à Economia actual, o curso superior de Comércio; trabalhou na Junta de Comércio Público, a antiga Caixa Geral dos Depósitos. Mas tinha outra vida, que interessava mais do que esta: era intelectual e dedicou-se a escrever sobre iluminuras. Fez trabalhos muito interessantes sobre os Livros de Horas.

O que são Livros de Horas?

São os calendários do Renascimento e da Idade Média, onde cada folha do mês representa uma cena: a cena que mais marca esse mês. Os das casas reais eram iluminados por grandes artistas. Para um miúdo como eu, era fascinante ver essas gravuras.

Cervantes também era maneta, e escreveu o Quixote. A vida do seu tio-avô foi menos marcada pela deficiência do que poderia ter sido. O que quer dizer muito da têmpera deste homem... Um homem é muito mais do que o corpo que o transporta.

Ah, com certeza [Levanta-se e vai buscar um livro] Talvez isto lhe dê uma visão [do trabalho que desenvolveu]. É o principal estudo que ele fez. Mostro-lhe para que perceba qual era a atmosfera

Porque é que se interessava pelas iluminuras?

Porque tinham bonecos [risos]. E porque o meu tio me explicava o que é que representavam. O meu tio fez uma descoberta sobre o Apocalipse de Lorvão, e comparou os cavaleiros (do Apocalipse do Lorvão) com os cavaleiros da gravura do Dúrer.A Peste vem com a foice da morte,a Guerra vem com um espadalhão, a Fome vem com um tipo muito esquelético; o quarto vem com uma balança

A Justiça? Como pode ser?

Toda a gente julgou que era a Justiça; o meu tio disse que era a lnjustiça Como é que a Justiça vinha como um cavaleiro da maldade,a cavalgar ao lado da Fome,da Peste e da Guerra ?
O que vem é a injustiça social. Porque era comum a balança que se pagava o salário dos trabalhadores; as moedas não se contavam, pesavam-se.A balança desequilibrada é a injustiça social, é o dinheiro mal pago ou roubado ao trabalhador.

O que é que há em comum entre todas as gravuras?

A cidade ao fundo.


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Ou seja, uma relação entre o campo e a cidade, a natureza e o espaço construído.

Há uma identidade, uma coisa não vive sem a outra. A cidade extravasou por todo o lado. Onde é que está agora como estava nas iluminuras - a actividade agrícola? Isso é uma das causas desta crise.

O desequilíbrio?

Sim. Destruiu-se uma unidade que havia Nas iluminuras, a cidade está sempre presente na actividade agrícola Na Catedral de Siena nos frescos que estão à entrada, há uma representação de uma cidade: dentro de umas muralhas, as portas estão abertas e há uma comunicação permanente entre o campo e a cidade, com gente a entrar, a sair, e o campo organizado; do outro lado, está a mesma cidade com as portas fechadas e cá fora não há nada Na primeira está o título "O Bom Governo", na segunda está "O Mau Governo".

Tudo o que teve peso na sua vida estava enunciado aí. A sua vida fez-se nessa oposição, nesse diálogo.

Eu tinha duas possibilidades: ou ia para Arquitectura ou para Agronomia Eu desenhava bem, e ainda desenho - dizem. Mas para entrar em Arquitectura, tinha de desenhar a cabeça de um romano, o Vitélio. O Vitélio era muito gordo..., não tinha graça nenhuma. "Então vou para Agronomia". Aí dá-se um golpe de sorte: no dia em que entrei para Agronomia vinha da Alemanha montar o curso de Arquitectura Paisagística o [Francisco] Caldeira Cabral. Juntei as duas coisas.

Tem à sua volta, nesta sala, os Livros de Horas onde aprendeu com o seu tio-avô, os soldadinhos com que brincou, os frescos nas paredes. São amostras do passado. Conte mais deste mundo que era o seu.

As pessoas do campo que eu tinha, como o meu pai e os meus tios, eram juristas que depois abandonavam a profissão e ficavam nas terras como proprietários. Ou então eram oficiais do exército. O meu pai era oficial do exército e era veterinário; foi quem comprou os garranos em Trás-os-Montes para servirem na tropa, como depois serviram as mulas. Este lado marcou-me muito. A visão que eu tinha da cidade era a Avenida da Liberdade, onde brincava à tarde com outros meninos e meninas, principalmente no Verão. Os táxis estavam parados no meio da faixa de rodagem, todos enfileirados por ali fora Uma figura principal, que gostava muito de ver, era o polícia sinaleiro. Por outro lado, tinha uma influência muito grande, da parte da minha mãe e do meu tio-avô, do mar. Isto é uma confusão tremenda...

PARA PROPRIETÁRIO, NINGUÉM ME EDUCOU!, FELIZMENTE.


 
Entre a terra e o mar.

Está aqui o barómetro [enorme, preso na parede] .Herdei-o de um tio, o chamado Capitão Menino. Foi um fulano que saiu de casa com 16 ou 17 anos para ir navegar. O barómetro é do Brigue Florinda

Florinda era quem?

Era uma das minhas tias. O barco tinha de ter o mesmo nome.

Como é que se chamava a sua mãe?

Gertrudes Guilhermina, um nome horrível, não se pode arranjar pior! É uma figura importantíssima Era filha única, e como filha única vivia bem.

Provinha do mesmo estrato social do seu pai?

A mesma coisa Era inteligente, gostava de ir ao São Carlos. Não lia muito, mas ouvia o meu tio, e estava naquele ambiente. Não se abria com facilidade. Era capaz de gostar muito de uma criança porque tinha uns olhos bonitos ou porque era magrinha.

Parece, a partir dessa descrição, uma personagem de um romance de Agustina. Espirituosa e com um carácter caprichoso.

Sim, sim. Quando as cozinheiras tinham umas grandes cabeleiras elas pedia-lhes para lhes cortar o cabelo, só porque achava graça. E aqui na rua havia uma loja de hortaliças, onde viviam uns miúdos, coitados, que tinham pouco; ela adorava vê-los na cama Achava aquilo um quadro espantoso. E depois auxiliava-os.

Auxiliava-os, a esses e outros, por via do catolicismo?

Ela não se organizava com ninguém, era independente. Essas da Agustina também devem ser... Com um mundo próprio, e pouca gente lá entrava. Não tinha grandes amigas. A minha mãe gostava das pessoas humildes. Talvez fosse para ela um drama ainda viver numa sociedade em que uns eram humildes e outros não.

Era afectuosa?

Para mim era muito afectuosa. Gostava mais de rapazes, dos sobrinhos, do que das raparigas. Achava-as impertinentes. Coisa espantosa: na família do meu pai, a primeira menina que nasceu, ao fim de 70 anos, foi uma filha minha.

Uma casa de varões.

Só havia uma tia Vivíamos na Rua das Pretas e o meu pai, volta e meia, saía a cavalo e subia a Avenida [da Liberdade] com um impedido atrás, também a cavalo,

O seu pai era uma encarnação destes soldadinhos com que brincava e que agora tem em exposição?

Não. Era um militar'sul generis'. Dedicava-se mais à veterinária e aos cavalos do que à tropa Acabou por sair tenente, nem a capitão chegou.

Era suposto que fosse jurista, veterinário, proprietário?

Para proprietário, ninguém me educou!, felizmente. Em relação ao que queria fazer, sempre tinha um objectivo: polícia sinaleiro, oficial de marinha por causa do barómetro, depois agrónomo por causa de Coruche, depois intelectual e arqueólogo como o meu tio-avô. Quis ser tudo ao mesmo tempo, ou antes, numa catapulta sucessiva Até que caí, já com 22 ou 23 anos na arquitectura da paisagem.

A arquitectura paisagística é um dos eixos essenciais da sua vida. O outro é a causa cívica, seja no Centro Nacional de Cultura, seja, já em democracia, como ministro- para citar apenas dois exemplos. A política também estava em sua casa?

O meu tio-avô era um "liberalão" de todo o tamanho, a minha mãe não era uma "liberalona", mas não podia com o Salazar. Quando as primas todas assinavam aqueles papéis a favor do Salazar, recusava-se a assinar. Quando chegaram lá com o papel das Mães Agradecidas, não assinou.

E o seu pai?

O meu pai acabou muito cedo em termos de poder físico e intelectual, com aquilo que é hoje conhecido como Alzheimer, (ou coisa parecida). Fechou-se muito cedo. Mas era monárquico, como toda a família. Não era salazarista, e não era tão acintoso como a minha mãe. A minha avó, quando já não estava assim muito bem do miolo [risos], ainda esperava que chegasse o Paiva Couceiro com os monárquicos do Norte no dia tantos, às tantas horas; se não chegavam, ficava muito triste.

Eles falavam, por exemplo, da morte de D. Carlos?

A minha família de Coruche, do lado do meu pai, era toda D. Carlos. A família da minha mãe tinha uma costela miguelista. Os miguelistas tinham duas facções, os absolutistas e os realistas. Não podiam uns com os outros. A família da minha mãe era realista e a do meu pai era monárquica, mas liberal. Isto hoje não tem interesse nenhum...

Na altura, entusiasmava-os muito essas discussões, essas disputas?

Sim. Em casa discutia-se muito.

Se Portugal tivesse entrado na Segunda Guerra, uma vez que nasceu em 1922, podia ter sido mobilizado. Era um mancebo entre 39 e 45.

Ah, lá ia eu.

O que queria perguntar é se esse fantasma pairou sobre a sua família e sobre a sua vida?

Não. Você, agora, é que está a levantá-lo. O meu pai é que esteve mobilizado, em 1918, para ir para a Primeira Guerra. Não foi porque a guerra acabou. Eu nasci em 22. Eles já tinham tido uma criança que morreu, depois vim eu e depois o meu irmão.

A coragem, a tenacidade e a frontalidade são coisas que se notam em toda a sua intervenção pública. Gostava de perceber de onde vêm.

Eu tive medos terríveis.

Em que situações teve medos terríveis?

Por exemplo, vou comemorar, com todos os que ainda são vivos e que assinaram aquele papel da Igreja do Rato, a ida à Assembleia da República Entrámos dois, eu e outro, não me lembro quem foi o outro. Queríamos entregar aquilo à pessoa mais importante da Assembleia. Percorremos os corredores todos, um empregado mandava-nos para o outro, e para o outro. Até que estávamos outra vez na rua e tínhamos ainda a carta na mão... Então, resolvemos deixá-la ficar na recepção.

Era medo de quê? Ir preso?

Bem, ir preso não era muito brilhante, naquela altura..

Mas esse não é um gesto de medo, e esse gesto é de afrontamento.

É medo, medinhos, de fugir. Às vezes também fujo. Todos temos uma costela de cobarde - terrível. Quem é que faz de juiz das situações? Eu estava metido no barulho. Tinha medo de ir preso por aquilo que se contava dos presos. Também tinha medo do que pensava a família

O que pensaria a família aristocrática de um filho revolucionário...

Não era fácil, não tendo uma estirpe de revolucionário. Tinha receio da família numerosa, onde havia todos os leques possíveis e imaginários; não era da minha mãe. Portanto, não era medo, era a chatice. Houve uma época em que, para os comunistas, era um furioso tipo contrário a eles, e para os contrários a eles eu era um furioso comunista! [riso]

Como é que tresmalhou, se posso dizer assim, e se meteu com os revolucionários?

Desde pequenino, desde muito pequeno, o meu tio tinha um espírito muito liberal. Quando fui para a universidade, apanhei logo o grupo que deu origem ao Centro Nacional de Cultura.

Com quem é que se dava, quem eram os seus amigos e os seus interlocutores?

O [Francisco] Sousa Tavares, o mentor daquela gente, o Fernando Amado, do teatro, o Afonso Botelho, também muito amigo e que escreveu umas coisas, o Gastão Cunha Ferreira, o Henrique Ruas, o João Camossa, que deu em anarquista (Conhece a história? Morreu há relativamente pouco tempo. Vivia andrajosamente na rua).

O que havia em comum nesse grupo?

Foi um grupo de monárquicos extraviados da causa monárquica, que tinham apanhado uma lambuzadela do António Sardinha e daquela gente do liberalismo lusitano. Não aceitavam a causa monárquica porque era muito conservadora, porque estava feita com o Salazar. Isso é que deu origem ao CNC e às primeiras listas de monárquicos independentes, que foram escondidas pela imprensa porque não convinha ao Salazar aparecer gente com esse cariz na oposição. E deu origem a que o Congresso Democrático de Aveiro fosse Democrático. Era para ser Congresso Republicano, mas para esta gente poder entrar, mudou.


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Foi ao Congresso?

Não consegui lá chegar por cobardia minha. Podia ter ido a correr mais depressa para Aveiro e não fui. Não fui por causa da família Mas não tive medo porque mandei a papelada toda Podia ter sido preso na mesma

É uma geração. Foi um tempo. De transição.

A oposição era republicana, jacobina, e alguma parte ainda é. Vivia ainda toda a problemática da Primeira República. Aqueles que eram monárquicos, mas que não queriam nada como Estado Novo, consideravam a Segunda República uma Primeira República Ou se confundiam com esse jacobinismo, o que não queriam nem podiam, ou eram atirados para a zona de apoio ao Estado Novo. Assim nasceu todo este grupo de que estou a falar, que mete católicos, contra a situação. Daí a entrega dessa carta dos monárquicos e da Igreja do Rato.

Quando vai entregar essa carta, teme a reacção da família?

Não, a carta não, nem o conteúdo da carta O que havia era as ausências perigosas que eu fazia..

O que é isso das "ausência perigosas'?

Ir para onde não devia ir! Estivemos metidos em muitas revoluções anteriores ao 25 de Abril. Mas isso é uma coisa que não se conta

Porque é que não se pode contar?

Tem que ser com mais gente. Tenho medo de já ter transformado a realidade a que assisti, e em que estive, num imaginário meu. Coisas em que pensei na época e que nunca realizei, hoje aparecem como se tivessem existido. Não quero isso de maneira nenhuma! Já vi dois ou três casos em que isso sucedeu e não quero que suceda comigo. Não quero morrer a dizer: "Afinal,não foi bem aquilo que disse". E afinal, disse porque o que era da memória estava transformado em imaginário.

Quando é que percebeu isso? Que é um modo de perguntar quando é que começou a envelhecer.

Exactamente. Lá para os 78,79.

Aconteceu alguma coisa de especial?

Não. Mas sente-se perfeitamente. Começamos a não saber "Mas isso teria sido assim mesmo ou fui eu que imaginei?, como é que isto surge?". Há coisas que perdem a racionalidade, e a gente começa a duvidar se existiram.

Receou que se abatesse sobre si a doença que se abateu sobre o seu pai, e ficar com períodos de ausência?

Tenho medo. E preciso muito cuidado com a memória não esteja eu já a viver noutra [dimensão]. Acho que todas as pessoas passam por isso.

Isso aconteceu há quase 10 anos, tem agora 87. Está óptimo.

Ainda estou bom, ainda posso dizer-lhe isto! A primeira condição para não estar bem era dizer-lhe tudo com imagens.

Vamos voltar aos anos da oposição, nomeadamente a 1958. Decide apoiar a candidatura de Humberto Delgado. Nessa altura, o CNC funcionava como uma plataforma de liberdade, uma congregação de gente desigual que não se encaixava em nenhuma das suas casas de origem.

Era um espaço de liberdade, de encontro. Havia gente católica da Igreja do Rato, o Tareco [Francisco Sousa Tavares], o Nuno Vaz Pinto, a Sophia de Mello Breyner, o Alçada Baptista

O Alçada, quando dirigia a Seara Nova, publicou-lhe um artigo que ficou famoso: "O homem perante a paisagem".

O artigo é muito bera! Já escrevi muito melhor sobre a paisagem. O Delgado: lembro-me de ir com um grupo a casa dele e convidá-lo para ir connosco. E ele disse-nos que não, porque já estava comprometido com uma gente do Porto! Isto antes de se ter candidatado. Mas tinha muito respeito por nós, e para o mostrar tinha lá um quadro a óleo comprado em Londres, na Feira da Ladra: o da Dona Catarina de Bragança!

Essa veia monárquica, era uma coisa inflamada e central na sua vida, ou era só um dos seus aspectos?

Era central. Por duas coisas: a minha família, o meu pai, o meu avô, sofreram bastante. A República chateou muita gente. Não lhes roubaram nada mas tratavam-nos mal e com pouca consideração. Aquilo foi um sarilho de liberdade, só visto e percebido. Portanto, venho com essa leitura: de horror. Conhece a Ilustração Portuguesa?, sabe o que fizeram aos padres jesuítas?

Não. Mas a sua cara transfigurou-se ao falar disso.

Raparam-lhes a cabeça! Mediram-nos de alto abaixo, os homens de bata, do Hospital Júlio de Matos, para saber porque é que eles eram jesuítas! Consideravam uma anormalidade ser jesuíta. Está a ver a lata que hoje era precisa para chegar ao pé de um padre, meté-lo num hospital e medi-lo para ver por que é padre... A irracionalidade tinha chegado a este ponto. Eu vivia muito isso e contra isso.

Deu-se com jesuítas?

Sim, o padre Eugénio Jalhay, que era arqueólogo. O meu tio, como tinha interesse pela arqueologia, tratava muito com o padre Jalhay.

Ou seja, foi educado num mundo em que se odiavam os excessos da Primeira República.

Eu vivia muito contra esse pecado da Primeira República Não a aceitava porque tinha conhecido familiarmente tudo o que tinha sucedido.

Que relação tem, e foi tendo, com a religião e com o catolicismo? É convicto?

Pretendo ser, porque ninguém é o que é. Tive uma grande influência familiar e do padre Jalhay. Talvez a pessoa menos religiosa fosse o meu tio. Fui apoiante do bispo do Porto. Escrevi um livrinho sobre a reforma agrária que lhe é dedicado, [a propósito da] pastoral sobre "A Miséria Imerecida do Nosso Mundo Rural". Ele depois foi corrido pelo Salazar.

Estava a dizer que pretendia ser profundamente católico.

E por isso fui presidente da Juventude Agrária Católica antes do 25 de Abril. Tive lá umas coisas engraçadas e outras em que nos estendemos ao comprido. Havia a Juventude Agrária, para os tipos do campo, e havia a Juventude Universitária, [de onde saiu] o Nuno Portas, o Teotónio Pereira e parte do grupo da Capela do Rato. Há outra coisa: andei a ter lições e a procurar saber filosofia. Achei que era necessário.

Que questões é que o inquietavam?

Tudo.

Quem somos, o que fazemos, o problema do Homem?

Porque é que somos, porque estamos aqui.

Apoiava-se na religião para responder a isso, ou, pelo menos, para se sentir mais amparado?

Não há ninguém com quem isto não dê na religião. Tem de dar. A pessoa não tem é certezas. Agora, procuras, tem de as fazer. Todos fazem.

E dúvidas, teve muitas? E crises?

Toda a gente tem crises, toda a gente tem dúvidas, todos os dias. O conhecimento absorve sempre a dúvida. Como é que há certeza sem haver dúvida? Claro, quando uma pessoa se sente completamente esclarecida, o melhor é ir-se embora, é a altura de partir...

Foi um homem sempre muito gregário; a partir de que momento é que se sentiu autónomo, até em relação ao seu tio e aquela forma de tutoria?

Foi na universidade. Mas não é uma coisa que diga: "Amanhã vou ser diferente". Uma pessoa, a certa altura, descobre-se de outra maneira.

Quais foram as grandes questões políticas que discutiu? Que filosoficamente e na prática o ocuparam.

Liberdade, igualdade, fraternidade, mutualismo, solidariedade: tudo isso é uma coisa linda Mas quando nos impingem a cidadania, a coisa complica-se... O que é o cidadão? Para mim, não é só ter direitos e deveres: é ter que servir. Foi aí que compreendi melhor o problema da monarquia. Porque o cidadão fica-se na Revolução Francesa, não vai ao serviço. Os ingleses têm a ideia do serviço, que nós perdemos. Têm o serviço do rei, da rainha - é indiscutível. É uma condição. Não é para estar, é para ser. Através de uma simbologia e de um veículo humano.

O veículo humano é o rei e a rainha?

É. Inventou-se agora uma palavra para substituir o serviço, mas falta-lhe a humanização: é solidariedade. O Cavaco todos os dias a atira para o ar! [riso]

Quando é que despertou para as questões ecológicas?

Houve um período em que fui muito a África, porque fiz grande parte da urbanização de Nova Lisboa Tinha lá um amigo que me integrou nas visões ecológicas, para além da arquitectura paisagística- o Eduardo Cruz de Carvalho. Ele teve de sair do país e foi parar a Los Angeles. O seu conhecimento de África era espantoso; tudo o resto que se tinha, era um conhecimento cinematográfico, do Tarzan, dos escravos e dos pretos com um caldeirão. Ele foi caçado pela universidade de LA onde foi dar a disciplina de África, e de onde trouxe, para Portugal, a Ecologia.

Quando teve poder na política, além de ser Ministro de Estado, foi ministro de uma coisa chamada Qualidade de vida. É uma designação bonita. Deu-se bem, gostou de ter poder?

Dei, dei. Porque achei que estava lá para servir qualquer
coisa. Ainda bem que lá estive.

Foi Francisco Pinto Balsemão que o convidou?

Não, foi o Sá Carneiro. Mas não foi para ministro.

Como é que se conheceram?

Foi antes do 25 de Abril. Uma vez, quando eu funcionava neste grupo do Fernando Amaro e do Sousa Tavares, lembrei-me de conquistar o Sá Carneiro! Ele já estava na Assembleia Nacional e resolvi ter uma conversa muito séria no Grémio Literário. Fiquei amigo dele. Ele sabia perfeitamente como eu pensava. Foi por isso que o PPM entrou, mais tarde, na AD.

Por causa dessa relação entre os dois?

Mas não entrei eu para ministro! Fiquei de fora. Inteligentemente. O Sá Carneiro tinha toda a razão de só me deixar ir como deputado... Eu não era muito maleável em termos políticos, para além de certos limites. Fez bem porque tinha que avançar num sentido e eu era um trambolho ao lado. Eu já tinha sido secretário de Estado e sub-secretário de Estado.

Foi logo no primeiro governo provisório que foi sub-secretário de Estado.

Foi o Nuno Portas, o Teotónio Pereira e essa gente que me chamou. Eu era considerado mais à esquerda do que eles! Por isso é que alguns Capitães do 25 de Abril me chamaram para o governo provisório. E quando vieram os governos constitucionais, não fiquei no governo com a AD, fiquei como deputado.

No rescaldo da revolução, foram os Capitães de Abril que o chamaram. Já não era um monárquico perigoso cujo campo não estava bem definido... Como é que era olhado?

Era olhado como uma pessoa que conhecia muito bem os problemas da Ecologia

Mais tarde, Balsemão vai buscá-lo.

E eu fui. Fui porque naquela altura era jogar tudo por tudo - sentia-se isso perfeitamente. Foi quando joguei a RAN [Reserva Agrícola Nacional], a REN [Reserva Ecológica Nacional] e os Planos Regionais de Ordenamento do Território, o Ordenamento do Território. Antes, não se tinha jogado [nada disto], nem se tinha jogado a conservação da natureza, os parques naturais, a defesa do solo vivo, etc. Em força, [a criação da] reserva agrícola e da reserva ecológica [avançaram] com o Balsemão.

Tudo isso que criou e implementou aprendeu com quem?

Como Caldeira Cabral, com o Cruz de Carvalho. Outras áreas, mais específicas, aprendi com pessoas específicas. E com o café.

Com as conversas de café?

Exactamente, com os meus colegas do café.

Que cafés é que frequentavam?

Havia muita conversa de café onde essas coisas se debatiam muito. Eram conversas muito importantes que daí alargavam para o CNC, O Martinho do Rossio era mais virado para as agronomias e para os solos e a Brasileira do Chiado era mais para as Artes, para as Agronomias. Eu andava de um lado para o outro.

E tinha tempo para tudo.

Às cinco horas fechava a loja e abriam os cafés!

Ao mesmo tempo tinha a sua vida pessoal. Casou com que idade?

Casei tarde. Em 1952, com 29 anos. Porque é que casei tarde?
Não sei, tinha muito que fazer.

Olhando para o seu percurso, temos a ideia de que é um homem do espaço exterior, e não é só por causa da ligação à Ecologia ou aos jardins; é também por causa da intervenção cívica. Como se tudo se passasse no espaço social. Por isso queria saber que importância teve a construção de um espaço interior e da família.

Teve muita importância E como nas iluminuras: a actividade agrícola está à volta da cidade. Aminha vida interior é a cidade, tudo à volta é a paisagem.

O espaço interior é o da cidade, que é o espaço das ideias?

Das ideias, da família, até de coisas de que estou a fazer um esforço enorme para me libertar, que é dos objectos. Às vezes, o espaço interior também é um espaço de objectos. Os soldadinhos, o barómetro, muitos livros. Isso é o espaço interior em que as pessoas vivem. Por vezes, é terrível.

Porquê?

Porque é uma obsessão. Quando tiver a minha idade percebe que os objectos vão perdendo valor. Ou antes, vão adquirindo um valor imaginário. Suponha que um objecto me foi roubado: o objecto continua a existir nesse imaginário. É um penduricalho, é muito chato. Passam a ser fantasmas.

O que é que resiste? E o que é que na sua vida tem valor?

Os objectos só têm valor se tiverem uma história. O que não é objecto só tem valor se serviu para alguma coisa. Preciso de mandar a história passear! Só que ainda não fui capaz de mandar a história passear... O que é um objecto com história? Responder a isso já é uma coisa mais complicada. O que é a essência de um objecto com história?

E da sua intervenção pública?

Importam as que serviram. A REN, por exemplo. Vanglorio-me muito com isso, mas não quero andar a apregoar que fui eu: foi o Café Martinho e uma data de gente que meti a fazer estas coisas.

Profissionalmente, entre as coisas que fez e de que mais se orgulha, estão também os jardins da Gulbenkian? É uma obra em que se pensa imediatamente quando se pensa no seu trabalho enquanto arquitecto paisagista.

É uma obra minha e do António Viana Barreto. Aparte de terraços e plataformas, que é muito importante, é mais dele do que minha Depois há aparte exterior, que é pensada pelos dois e por quem fez a classificação do que lá estava antes de se construir a Fundação. Acho bem. Mas há outra de que gosto muito e que pouca gente conhece: a Capela de São Jerónimo, em Belém.

Tem alguma planta de que goste especialmente, com que sinta uma especial identificação?

Há uma planta que caracteriza o país em termos científicos; são os carvalhos; e nas zonas húmidas, os salgueiros. Mas planta emblemática, para mim, é a laranja Se for a uma quinta no Norte verifica que tem a mata com carvalho, tem a horta e o pomar de caroço. Se for a uma quinta no Sul tem a horta, tem a mata, e uma coisa que não varia: as laranjas.

Mas isso é a planta do país. Queria perguntar se há alguma de que o senhor goste especialmente.

Não. Mas num texto que fiz para os Caminhos de Ferro, descrevo uma viagem que fazia com nove, dez anos a partir da estação do Rossio para a terra do meu pai, Coru-che. Era uma viagem de quatro horas, actualmente são meia dúzia de quilómetros. Passava pelo vale do Tejo, parava num intercâmbio para o Sul, aí apanhava outro comboio, atravessava o Tejo e entrava num montado de sobro. Faço a descrição do que é que me d izia esse montado de sobro. Primeiro, os braços dos sobreiros, depois, aprofundidade e escuridão que se adivinhava quando se vinha de comboio. Ao mesmo tempo aparecia umaluzinha ao longe; era uma casa que existia e de que só se via a luz. Fiquei sempre com uma admiração ao montado de sobro.


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ANABELA MOTA RIBEIRO
MIGUEL BALTAZAR
Fotografia 

A BÉLGICA, UMA MONARQUIA CONSTITUCIONAL


Texto da Chancelaria do Primeiro Ministro – Direção Comunicação Externo
Tradução : Embaixada da Bélgica em Brasilia e Consulado Geral de São Paulo – Setembro 2005

Em 1830, a Assembléia Constituinte da Bélgica recém-nascida escolheu a Monarquia como regime político e, mais precisamente, uma monarquia parlamentar, constitucional e hereditária. Cento e setenta e cinco anos depois, este conceito, sob a sua forma inicial, mantém-se praticamente inalterado, mesmo com a evolução do país ao longo dos anos.

Ao optar pela Monarquia, o Congresso Nacional visava certos benefícios (vantagens), tais como a estabilidade, a continuidade e a influência internacional. Ao mesmo tempo, queria-se evitar que o poder político pessoal do chefe do Estado fosse importante demais. “Todos os poderes emanam da nação.” – afirma a Constituição.

O artigo 91 da Constituição determina que o Rei “… só toma posse do trono após ter prestado solenemente, no seio das Câmaras reunidas, o seguinte juramento: “Juro cumprir a Constituição e as leis do povo belga, manter a independência nacional e a integridade do território.” Este juramento é uma descrição sucinta da função real.

Como chefe do Estado, o Rei exerce as funções políticas que a Constituição lhe atribui. Em seguida, ele é o fiador do funcionamento das instituições.

É igualmente o símbolo da continuidade e da soberania do Estado, representa a Bélgica no estrangeiro e atua como o mais elevado representante da nação e da população.

O Rei e a Política.

Uma ação de influência.

O Rei situa-se acima das correntes políticas e, em conseqüência, não exerce nenhum poder político direto. Em contrapartida, o soberano pode exercer uma influência, apoiando-se sobre sua autoridade e seu prestígio pessoais. A sua ação de influência se manifesta em grande parte nos encontros pessoais. O Rei discute semanalmente com o Primeiro-Ministro. Além disso, encontra regularmente os demais ministros e secretários de Estado, presidentes de partidos, outros personagens políticos, autoridades e representantes de associações de interesses. Ele pode ouvir, dar conselhos, receber e apresentar propostas.

O Rei é o chefe dos Belgas, independentemente das suas opiniões. Por isso, não exprime publicamente sua opinião. O conteúdo das atividades políticas do Rei é mantido confidencial. Mas certos assuntos e linhas de força aparecem nos discursos reais em ocasiões especiais, por exemplo, a festa nacional, as visitas oficiais ou durante a recepção anual que oferece aos organismos constituídos.

Inviolabilidade.

A pessoa do Rei é inviolável; os seus ministros são responsáveis.

Qualquer lei ou decreto que o Rei assina deve igualmente ser rubricado por pelo menos um ministro. O Rei dá à lei uma autoridade constitucional, o ministro assume a responsabilidade.

A inviolabilidade política é estendida a todos os atos do Rei. Estes atos estão sob a responsabilidade do governo federal e passam, portanto, por análise e aprovação.

Esta disposição coloca o Rei acima das considerações ideológicas e religiosas, das opiniões e debates políticos e dos interesses econômicos.

O Rei é igualmente o guardião da unidade e da independência do país.

As Prerrogativas.

No plano político, a Constituição atribui diversas tarefas específicas ao Rei. O soberano pode convocar e dissolver o Parlamento. Assina os projetos de lei. Nomeia e destitui do cargo os seus ministros.

Na prática, o Rei escolhe um informante para a formação de um governo e, em seguida, um formador. A formação do governo deve ser aprovada pelo Parlamento.

Os ministros federais prestam juramento sobre as mãos do Rei.

O Papel Político do Rei.

O Rei está à frente do poder executivo federal. Os funcionários e oficiais são nomeados por decreto real e prestam juramento ao Rei. O soberano é também o Comandante em Chefe das Forças Armadas ele, estabelece a graduação militar.

No plano jurídico, o Rei nomeia e destitui do cargo os oficiais do Ministério Público. A justiça é concedida em nome do Rei. O soberano tem o direito da absolvição. O Rei está igualmente à frente das relações internacionais. Os embaixadores estrangeiros que representam o seu chefe de Estado na Bélgica entregam as suas credenciais ao Rei. O soberano representa a nação e a população, no caso das visitas oficiais ao estrangeiro e recepciona os chefes de Estado em visita à Bélgica.

Por todo o exposto, prevalece o princípio segundo o qual o Rei “reina, mas não dirige”. Para quase todas as tarefas, é estabelecido que o soberano exerce a sua função de acordo com o governo.

A Casa Real e a Sociedade.

Na Bélgica, a noção “de Monarquia” tem um significado bem mais amplo que um simples regime constitucional. O soberano é denominado “Rei dos Belgas” e não “o Rei da Bélgica”. Indica-se assim que o soberano está à frente de uma sociedade, não de um território. Por esta mesma razão, ele não tem nenhum atributo de poder, como coroa ou cetro.

O Rei é o mais alto representante da nação e da população. A este respeito, os membros da família real ocupam também um lugar específico na sociedade.

Recepções no palácio ou visitas que chegam ao país constituem um aspecto importante do trabalho do soberano e da sua família. Trata-se freqüentemente de incentivar e apoiar iniciativas louváveis. No caso de catástrofes, o Rei exprime a compaixão de toda a população e a consideração pelo trabalho das pessoas que socorrem. Eles participam de cerimônias específicas, como a festa nacional, e das comemorações pelas vítimas de guerra.

O Rei e os membros da família real atribuem regularmente o seu elevado apoio a uma organização. Podem ser projetos permanentes ou temporários em matéria de cultura, de sociedade, de economia, de ciência ou desporto. O Rei concede igualmente distinções e está à frente das ordens nacionais. Ele pode atribuir títulos de nobreza, mas sem associá-los a qualquer privilégio.

Freqüentemente, os incentivos reais tomam a forma de felicitações nos casos de certos aniversários especiais, da atribuição do título de “Real” a uma associação, do apadrinhamento de uma sétima criança seguida do mesmo sexo, etc..

O Rei e a Rainha recebem diariamente centenas de cartas. Constantemente, o soberano é o último interlocutor para pessoas em necessidade. Os pedidos de assistência ou de intervenção são transmitidos aos serviços competentes e acompanhados pelo palácio, com o intuito de uma solução favorável.

Diversas iniciativas reais tornaram-se organizações permanentes em benefício da sociedade. Entre outras, as mais conhecidas são: a Fundação Rei Baudouin, a Fundação Rainha Paola e a Fundação Príncipe Philippe.

A Fundação Rei Baudouin toma iniciativas que visam melhorar as condições de vida da população, tanto nos planos econômico, social e cultural, como científico. No que se refere à Fundação Rainha Paola, é sobretudo o Prêmio Rainha Paola para o ensino que alcançou uma grande notoriedade. A Fundação Príncipe Philippe tem por missão favorecer o diálogo entre as diferentes comunidades do nosso país.

175 Anos de Dinastia Belga.

fonte : http://www.belgica.org.br/Monarquia.htm