por Secretário-Geral Partido Popular Monárquico a quinta-feira, 10 de Março de 2011 às 17:07
Ontem vi, finalmente, o aclamado filme “O Discurso do Rei”, tal acontecimento não seria digno de memória futura se não tivesse coincidido com outro discurso, este mais polémico, também proferido durante o dia de ontem.
O “Discurso do Rei” é exactamente aquilo que esperava, um grande filme com boas interpretações, amplamente elogiado pela crítica e premiado com os mais altos galardões da sétima arte. O que me chamou a atenção, no entanto, foi a coincidência deste filme surgir durante o período que o nosso país atravessa. O filme aborda, e muito bem, duas vertentes, a pessoal e a política. Podemos compreender, ao vê-lo, aquilo que a monarquia inglesa sabe exemplificar melhor do que nenhum regime. O Rei tem duas pessoas, a pública e a privada. A pessoa privada pode ser amável ou detestável, pode sofrer de inúmeros problemas, pode despoletar ódios e paixões, pode ser genial ou um perfeito idiota. A pessoa pública, contudo, está para lá de tudo isto. Deixem-me exemplificar melhor deste modo, quando o rei morre a frase que é proferida é: O Rei morreu! Viva o Rei! Ou seja, a pessoa pública, a encarnação do ideal real não morre, permanece. Por ser perene a instituição real garante a continuidade, a segurança, a certeza do futuro. Porque em monarquia a pessoa individual do rei submete-se ao bem maior que é a sua função pública e política.
Ao ver o filme muitos são levados a humanizar a figura de Jorge VI, desde a sua infância conturbada aos problemas de gaguez e timidez. Alguns incautos poderão mesmo achar que se tratava de alguém incapaz, e que apenas a obrigação da sucessão real o colocou num lugar de destaque na História contemporânea. Nada mais incorrecto.
Jorge VI tornou-se rei quando o povo começava a deixar de acreditar na monarquia. A crise da abdicação do seu irmão, Eduardo VIII, tinha feito mais pela descrença na instituição real que toda a propaganda republicana até então. O que me leva a questionar: Então o que levou Jorge VI a tornar-se um símbolo da unidade, resistência e liberdade? Como pôde este homem, aparentemente fraco, assumir o controlo de um império num dos períodos mais conturbados e difíceis da História Mundial? Quando os bombardeamentos alemães destruíam Londres, o Rei e a Rainha recusaram deixar a capital, tendo mesmo escapado à morte a 13 de Setembro de 1940 quando duas bombas alemãs explodiram no Palácio de Buckingham. O Rei entendeu que devia permanecer junto do seu povo e sofrer tal como ele os mesmos perigos e privações. O seu relacionamento com Winston Churchill foi exemplar, entendendo que se tratava de um momento crítico, ambos mantiveram um relacionamento muito próximo. Jorge VI enfrentou a II Guerra Mundial, a Queda do Império Britânico e no entanto conseguiu restaurar a confiança na monarquia, tornando-se um símbolo da resistência inglesa.
Voltando aos dias de hoje e ao nosso Portugal. Ontem, Cavaco Silva tomou posse como Presidente da República e fez um discurso. Para um momento político tão importante como aquele que atravessamos, não posso deixar de pensar que tal discurso soube a pouco. Cavaco Silva passou os últimos cinco anos embalado por uma letargia provocada pela sua preocupação com a reeleição. Agora, acordou. Não se conteve em identificar os problemas que assolam o país, desde a economia à grave crise social, até apontou o dedo ainda que subliminarmente aos culpados. Foi um discurso duro, até cruel, disse Carlos César. O que vimos ontem foi uma ensaboadela ao governo, foi como se Cavaco Silva dissesse: Meus senhores… agora vou governar! Ah mas o Presidente não governa. Alguém devia esclarecer duma vez por todas afinal qual é o papel do Presidente da República Portuguesa. Dizer que ele possui o poder moderador, traduz-se em quê? A verdade é que quando a Monarquia acabou em Portugal (e sim digo que foi a Monarquia que acabou e não a República que venceu porque foi isso mesmo que aconteceu) o chefe de estado deixou de ter um papel a desempenhar. Os primeiros Presidentes da República poucas competências tinham, o único a afirmar-se foi Sidónio Pais, logo rotulado de “Presidente-Rei”. Durante o Estado Novo o Presidente do Conselho detinha os poderes legislativo e executivo e sabemos bem quem, no fundo, escolhia os Presidentes da República. Após o 25 de Abril de 1974 tentou atribuir-se um novo significado à figura do chefe de estado, o papel de moderador entre os diversos poderes estabelecidos. No entanto, o que temos assistido, com maior preponderância nos últimos anos tem sido para um regime em que o Primeiro-Ministro é Presidencialista. Apenas Jorge Sampaio parece ter percebido e usado as prerrogativas conferidas pelo cargo.
E assim, durante o dia de ontem, assistimos ao burburinho provocado pelo discurso do Presidente. Francisco Assis, líder da bancada do PS, estupefacto perante tamanho puxão de orelhas, do alto da sua indignação tomou a iniciativa de aconselhar o Presidente da República a voltar à postura que lhe tem sido característica dos últimos anos um “laissez faire laissez passer”, porque o Presidente da República quer-se sossegadinho, nada intrometido e sobretudo, menos crítico.
O facto do discurso de Cavaco Silva, uma iniciativa formal, protocolar, institucional, apenas ter sido aplaudida por duas bancadas parlamentares só reforça a ideia de que o Presidente da República, o cargo que ele representa está esvaziado de conteúdos, de simbolismo, reforçando a questão de que ele não é de todo o representante de todos os portugueses.
Quando o rei discursa ele fá-lo em nome do seu povo, porque nele reside a união de todos. O Rei não tem partido, o Rei não é de esquerda nem de direita, o rei não representa uma maioria. Quando o Presidente da República ontem discursou, ele falou para alguns, admoestou outros, tentou mal grado ser um porta-voz da juventude, essa “geração à rasca” que ele enquanto Primeiro-Ministro apelidou de “geração rasca”. Creio ser esta a diferença entre os dois discursos a que assisti ontem, um foi a voz de um povo o outro falou com a sua voz, individual, sectária, partidária.
(Artigo de opinião)
Valdemar Almeida
Secretário-Geral do PPM
O “Discurso do Rei” é exactamente aquilo que esperava, um grande filme com boas interpretações, amplamente elogiado pela crítica e premiado com os mais altos galardões da sétima arte. O que me chamou a atenção, no entanto, foi a coincidência deste filme surgir durante o período que o nosso país atravessa. O filme aborda, e muito bem, duas vertentes, a pessoal e a política. Podemos compreender, ao vê-lo, aquilo que a monarquia inglesa sabe exemplificar melhor do que nenhum regime. O Rei tem duas pessoas, a pública e a privada. A pessoa privada pode ser amável ou detestável, pode sofrer de inúmeros problemas, pode despoletar ódios e paixões, pode ser genial ou um perfeito idiota. A pessoa pública, contudo, está para lá de tudo isto. Deixem-me exemplificar melhor deste modo, quando o rei morre a frase que é proferida é: O Rei morreu! Viva o Rei! Ou seja, a pessoa pública, a encarnação do ideal real não morre, permanece. Por ser perene a instituição real garante a continuidade, a segurança, a certeza do futuro. Porque em monarquia a pessoa individual do rei submete-se ao bem maior que é a sua função pública e política.
Ao ver o filme muitos são levados a humanizar a figura de Jorge VI, desde a sua infância conturbada aos problemas de gaguez e timidez. Alguns incautos poderão mesmo achar que se tratava de alguém incapaz, e que apenas a obrigação da sucessão real o colocou num lugar de destaque na História contemporânea. Nada mais incorrecto.
Jorge VI tornou-se rei quando o povo começava a deixar de acreditar na monarquia. A crise da abdicação do seu irmão, Eduardo VIII, tinha feito mais pela descrença na instituição real que toda a propaganda republicana até então. O que me leva a questionar: Então o que levou Jorge VI a tornar-se um símbolo da unidade, resistência e liberdade? Como pôde este homem, aparentemente fraco, assumir o controlo de um império num dos períodos mais conturbados e difíceis da História Mundial? Quando os bombardeamentos alemães destruíam Londres, o Rei e a Rainha recusaram deixar a capital, tendo mesmo escapado à morte a 13 de Setembro de 1940 quando duas bombas alemãs explodiram no Palácio de Buckingham. O Rei entendeu que devia permanecer junto do seu povo e sofrer tal como ele os mesmos perigos e privações. O seu relacionamento com Winston Churchill foi exemplar, entendendo que se tratava de um momento crítico, ambos mantiveram um relacionamento muito próximo. Jorge VI enfrentou a II Guerra Mundial, a Queda do Império Britânico e no entanto conseguiu restaurar a confiança na monarquia, tornando-se um símbolo da resistência inglesa.
Voltando aos dias de hoje e ao nosso Portugal. Ontem, Cavaco Silva tomou posse como Presidente da República e fez um discurso. Para um momento político tão importante como aquele que atravessamos, não posso deixar de pensar que tal discurso soube a pouco. Cavaco Silva passou os últimos cinco anos embalado por uma letargia provocada pela sua preocupação com a reeleição. Agora, acordou. Não se conteve em identificar os problemas que assolam o país, desde a economia à grave crise social, até apontou o dedo ainda que subliminarmente aos culpados. Foi um discurso duro, até cruel, disse Carlos César. O que vimos ontem foi uma ensaboadela ao governo, foi como se Cavaco Silva dissesse: Meus senhores… agora vou governar! Ah mas o Presidente não governa. Alguém devia esclarecer duma vez por todas afinal qual é o papel do Presidente da República Portuguesa. Dizer que ele possui o poder moderador, traduz-se em quê? A verdade é que quando a Monarquia acabou em Portugal (e sim digo que foi a Monarquia que acabou e não a República que venceu porque foi isso mesmo que aconteceu) o chefe de estado deixou de ter um papel a desempenhar. Os primeiros Presidentes da República poucas competências tinham, o único a afirmar-se foi Sidónio Pais, logo rotulado de “Presidente-Rei”. Durante o Estado Novo o Presidente do Conselho detinha os poderes legislativo e executivo e sabemos bem quem, no fundo, escolhia os Presidentes da República. Após o 25 de Abril de 1974 tentou atribuir-se um novo significado à figura do chefe de estado, o papel de moderador entre os diversos poderes estabelecidos. No entanto, o que temos assistido, com maior preponderância nos últimos anos tem sido para um regime em que o Primeiro-Ministro é Presidencialista. Apenas Jorge Sampaio parece ter percebido e usado as prerrogativas conferidas pelo cargo.
E assim, durante o dia de ontem, assistimos ao burburinho provocado pelo discurso do Presidente. Francisco Assis, líder da bancada do PS, estupefacto perante tamanho puxão de orelhas, do alto da sua indignação tomou a iniciativa de aconselhar o Presidente da República a voltar à postura que lhe tem sido característica dos últimos anos um “laissez faire laissez passer”, porque o Presidente da República quer-se sossegadinho, nada intrometido e sobretudo, menos crítico.
O facto do discurso de Cavaco Silva, uma iniciativa formal, protocolar, institucional, apenas ter sido aplaudida por duas bancadas parlamentares só reforça a ideia de que o Presidente da República, o cargo que ele representa está esvaziado de conteúdos, de simbolismo, reforçando a questão de que ele não é de todo o representante de todos os portugueses.
Quando o rei discursa ele fá-lo em nome do seu povo, porque nele reside a união de todos. O Rei não tem partido, o Rei não é de esquerda nem de direita, o rei não representa uma maioria. Quando o Presidente da República ontem discursou, ele falou para alguns, admoestou outros, tentou mal grado ser um porta-voz da juventude, essa “geração à rasca” que ele enquanto Primeiro-Ministro apelidou de “geração rasca”. Creio ser esta a diferença entre os dois discursos a que assisti ontem, um foi a voz de um povo o outro falou com a sua voz, individual, sectária, partidária.
(Artigo de opinião)
Valdemar Almeida
Secretário-Geral do PPM
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