O Bispo Emérito de Aveiro reflecte sobre as violações da pessoa e diz que são mais graves que as violações da natureza que os grupos ambientalistas procuram salvaguardar. Na crónica desta semana, o Bispo Emérito aborda questões como o aborto e a violência em ambiente escolar para lembrar que são casos cada vez mais numerosos.
Em prol de uma ecologia da pessoa humana.
Os movimentos ecológicos acordaram, em comum, para a resposta à interpelação urgente de um sinal dos tempos, que se pode traduzir pelo grito de respeito e defesa da natureza criada, ameaçada e, em muitos casos, já destruída, pelos atropelos que contra ela muitas pessoas fazem. Justifica-se a preocupação, dado que se trata de um bem de todos e a todos necessário. O que já se conseguiu neste campo, sobretudo com as crianças e a gente mais nova, é impressionante. Muito é o que se tem feito através da educação nas escolas, das campanhas publicitárias e da multiplicação dos meios adequados e acessíveis que ajudam a respeitar ambiente natural e a saber classificar e recolher resíduos e desperdícios. Se recordarmos o que entre nós se passava há trinta ou quarenta anos, vemos uma diferença abissal neste aspecto, hoje com proveito para toda a gente.
Acontece, porém, que natureza criada é, também, a natureza humana, a pessoa concreta e, no respeito por ela, há ainda muito caminho para andar. É verdade que a defesa da natureza criada e do que ela comporta e significa faz-se em razão das pessoas. Mas não podem parar aí os cuidados comuns. Há, segundo o que vemos e sentimos, a urgência de uma defesa clara da natureza humana, ou seja, das pessoas concretas, frente às agressões graves contra as leis que regem a sua vida.
Pensemos, por exemplo, na distribuição, nos centros de saúde públicos, de anticonceptivos químicos que bloqueiam, interrompem e desviam o curso normal das leis da natureza, muitas vezes com consequências graves na saúde da mulher. Cientistas de grande valor internacional, defendem e provam que os métodos naturais, não por razões morais ou religiosas, mas por razões científicas provadas, são os únicos que respeitam a sequência normal das leis da natureza em relação à concepção de novas vidas.
Atento, desde há muitos anos, a este problema, nunca vi os movimentos de ecologistas preocupados com o que se faz em relação ao aborto e com a destruição das mulheres, protagonistas de primeira importância, humana e social, na procriação. Os raciocínios correntes são redutores e parece interessar mais a eficácia, o imediato sem esforço, que o respeito pela natureza humana e suas leis, em ordem à vida procurada e defendida. Dirão que a ciência tem, também, a sua palavra. Pois que a diga, ao serviço da vida, não da sua destruição.
As violações da pessoa humana são mais numerosas e graves que as violações da restante natureza. Delas passam ao lado muitos ecologistas, delas se ocupa o Estado com mezinhas jurídicas. A sociedade foi-se deixando anestesiar e para tudo encontra justificação? Kabril Gibran, um profeta dos tempos novos, escreveu: “Os homens não têm a felicidade nos lábios, nem a verdade nas suas entranhas, porque a felicidade é filha das lágrimas e a verdade é gerada pela dor”. Quando as pessoas não valem, todas as coisas sobram. Uma ecologia a favor da pessoa humana não pode ser fruto de facilidades, de distracções, de prazeres imediatos. É uma luta diária. A natureza é para as pessoas e são as pessoas que lhe dão sentido e valor consistente.
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