O recente escândalo de Dominique Strauss-Kahn, acusado por uma criada de hotel de violação, está a preencher páginas de jornais e tempos de antena das televisões. Por se tratar de um crime sexual, e por DSK, como é conhecido no seu país de origem, ser à data dos acontecimentos director-geral do FMI e, mais importante ainda, provável candidato ao Palácio do Eliseu.
O tratamento deste caso tem todos os ingredientes para captar a atenção dos consumidores de notícias de escândalos: dinheiro, política e sexo. Tal como as histórias que envolveram o Presidente Clinton ou o primeiro-ministro italiano, mas aqui com a grande diferença de haver uma acusação de violência, o que torna o ex-ocupante da Sala Oval e o “cavaliere” Berlusconi em quase meninos de coro.
A notícia causou um terramoto em França, sobretudo no Partido Socialista, que via nele – inclusive mercê de sondagens que o davam como vencedor das eleições presidenciais de 2012 – o grande trunfo para recuperar a Presidência da República que desde François Mitterrand lhe tem escapado. Aliás, se o acusado pertencesse a um partido de direita, o abalo seria igual e as reacções semelhantes. Mas, imediatamente, o PS francês, ainda que oficiosamente, lançou a tese da cabala, o “complot”, que nós portugueses tão bem conhecemos da história política recente, para justificar a acusação. Sem, pelo menos de forma clara, nela implicar o partido do actual presidente, deixando no ar a possibilidade de serem países não europeus a quererem ocupar o lugar mais importante do FMI, os socialistas não deixam de dizer, pelas vozes de dirigentes menores, que DKS caiu numa armadilha para o afastar da corrida presidencial.
Neste caso lamentável, não faço juízos de valor sobre as atitudes “mulherengas” de Strauss-Kahn em que é reincidente, nem condenações prematuras, quando a Justiça ainda não se pronunciou definitivamente. Se tivesse que fazer acusações seria ao espectáculo montado em primeira mão pelo sistema penal dos EUA que fere a dignidade humana, e mesmo os criminosos confessos a têm, pelos meios de comunicação social para quem estes casos são uma forma fácil de vender o produto e para os leitores “voyeurs” que, como as hienas, se alimentam do esterco.
Mas, ao reflectir sobre este caso, não posso deixar de concluir que a simples enunciação da tese de “complot” – que pode muito bem ter existido – envolvendo um eventual candidato à Chefia do Estado francês, revela que a luta pelo poder, ainda que efémero, para o cargo de presidente da república, vem revelar que mesmo para a mais alta magistratura das repúblicas – que representam os seus países e os respectivos Estados, interna e externamente e deveriam ser a referência política das democracias – todas as formas de afastar ou diminuir possíveis adversários são possíveis, mesmo as ilícitas, pela legalidade ou pela ética. A chefia do Estado, pela sua importância nacional e política, não pode estar à mercê de lutas que a diminuem e põem em causa dignidade da função e de quem a encarna.
João Mattos e Silva in Diário Digital (23-Mai-2011)
Fonte: Real Associação de Lisboa
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