sábado, 21 de agosto de 2010

O REGICÍDIO (IV LEGISLATURA 29/01/1987)

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Momentos há na história que marcam profundamente a vida e o futuro das nações.

Momentos altos, admiráveis e para sempre admirados uns, momentos outros que, ao invés, marcam a existência, sempre tenebrosamente presente, da bestialidade e da ignomínia, lembram que a memória colectiva não é só cheia de glória mas também cheia com vergonha, que o sono da razão engendra monstros, que a injustiça, a estupidez e a brutalidade são também ingredientes da história dos povos.

Voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O regicídio de Fevereiro de 1908 - faz no próximo domingo 79 anos - é um desses momentos infaustos em que a inteligência é vencida pela brutalidade, em que a história e a nobreza de um povo são espezinhadas, em que a lógica infernal das alfurjas leva de vencida a limpidez e a honra dos homens e das instituições, em que a inveja bate a dignidade, a cobardia ganha à coragem, os instrumentos da tirania vencem a legitimidade e a história.

«Quando ao sol poente daquele dia - cito livremente Sousa Tavares - a antinação assassinou o rei e o príncipe real, caíram por terra, na pedra batida ali do arsenal, dois homens, uma Pátria, o carácter de um povo e um princípio secular de soberania.

Aqueles tiros de espingarda atingiram em cheio o objectivo marcado. Mais do que um rei, mais do que um homem na perfeita e total acepção da palavra, era o carácter de um povo que caía na rua, e com ele um fecundo sistema de aliança e de legitimidade do poder.»

Um ano antes, escrevia D. Carlos, talvez em lógica premonição: «Seja como for e suceda o que suceder, temos de caminhar para diante, ainda que a luta seja áspera e rude (e espero-a), porque aqui, mais do que nunca, parar é morrer, e eu não quero morrer assim.»

D. Carlos de Bragança não morreu, de facto, por ter parado, por ter desistido. Morreu porque lutou, no desvario dos tempos e das vontades, fiel à missão que assumia e à legitimidade que encarnava, fiel às franquias e liberdades dos Portugueses, consciente do sentido ocasional e restaurador que, porventura erradamente, atribuiu à ditadura, ele que disse e escreveu que «a força da nossa obra é governar com o Parlamento», ou que «fizeram-se as eleições com ordem e liberdade, ordem e liberdade em que é absolutamente necessário não só entrar agora, mas prosseguir».

Sobre o sangue derramado na calçada por D. Carlos e D. Luís Filipe de Bragança erigir-se-ia a República e, em cortejo, os seus anos de instabilidade e ditadura.

Cortado brutalmente o fio condutor da evolução para formas superiores de liberdade e realização histórica, Portugal afastou-se, quase irremediavelmente, do progresso político das politicamente mais felizes nações da Europa.

Importa, nas vésperas de mais um aniversário do regicídio, deixar bem clara a palavra de homenagem àquele que foi um dos melhores entre os melhores portugueses, D. Carlos I, rei de Portugal, ao seu altíssimo sentido do dever, ao seu profundo amor à sua Pátria, à sua vontade de servir o seu povo e de cumprir a sua missão, ao seu sacrifício, à sua honra, á sua gigantesca dignidade, como homem e como rei.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PSD.

(Fonte: Somos Portugueses)

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