Durante quase 200 anos esteve longe do olhar do público mas agora renasce completamente restaurada. A antiga Sala da Música do Palácio da Ajuda surge com a sua designação original: Sala D. João VI.
D. Maria Pia forrou as paredes a seda para evitar a sua deterioração. Agora descobre- -se o que ficou por baixo. Quando o pano subiu ficámos esmagados. O motivo foi uma pintura original de Arcângelo Foschini (1825) ocultada por baixo de várias camadas de seda - e até por uma de viscose - que retrata a chegada de D. João VI a Portugal, depois do exílio de 14 anos no Brasil. Escondida durante mais de um século e meio pela pomposa Sala da Música, concebida pela Rainha D. Maria Pia, a pintura conheceu a luz do dia o ano passado pela mão da directora do Museu do Palácio da Ajuda, Isabel Godinho, que com a iniciativa 'Uma Sala, Um Mecenas' conseguiu reunir fundos para o restauro integral do espaço. «Começámos pelas paredes e tectos, mas no final vamos também recuperar o chão. É um projecto que tem vindo a crescer progressivamente e não sabemos o que ainda nos reserva». Para já foi retirado o lambril que ocultava uma pintura de rodapé que seguiu para o Museu de Artes Decorativas de Paris para ser estudada. Por cá, a espanhola Rocio Ozores tenta reproduzir os ornamentos destruídos nos segmentos de parede em que faltam. Por toda a sala, especialistas em conservação e restauro dão o seu contributo à mais recente descoberta da Ajuda. «Todos os dias é uma surpresa. Hoje por exemplo encontrei este kitchen soap usado pelos criados para lavarem a loiça», comenta Isabel Godinho que ao fim de quase três décadas à frente do palácio continua a surpreender-se com o que o espaço ainda esconde. «Aqui, por exemplo, estava tudo rematado a lambril em madeira que só existia para fazer pandã com a galeria dos músicos». A ideia foi da Rainha Maria Pia que ao ver as paredes em tão mau estado resolveu forrar todo o espaço a seda vermelha e amarelo ouro, por ser a solução mais simples. E assim continuou por quase duas décadas. Agora é tempo de descobrir o que esteve oculto durante todo este tempo.
O trabalho é minucioso. Enquanto Rocio trata das pinturas, há quem esteja a substituir os fios de cobre do enorme candelabro do centro da sala. Depois, cada peça é colocada uma a uma e enxugada a secador de cabelo para evitar a oxidação do metal. Desvendado o trabalho mais meticuloso, João Vaz, responsável pelo núcleo de pintura do edifício, entusiasma-se a falar do quadro de mestre Foschini: «D. João VI foi para o Brasil em 1807 mas mandava directivas para os pintores da Ajuda. Com alguma frequência eles reuniam-se com o responsável da obra e discutiam quais as peças atribuídas a cada um. Ao Foschini calhou esta».
De acordo com a pintura, D. JoãoVI tinha gosto apurado. Uma das primeiras recomendações foi que aludisse ao Concílio dos Deuses, menção essa que se encontra no tecto da sala. O monarca referia ainda que a pintura deveria ser uma alegoria do seu regresso. O mestre deu-lhe ouvidos, mas o rei acabou por chegar quatro anos antes da pintura ser acabada, pelo que o que seria uma alegoria, acabou por representar os factos de 1821. Na Primavera desse ano, D. João VI deixou o Brasil e regressou a Lisboa acompanhado pela família. No quadro revê-se essa imagem, devidamente ilustrada pelos cânones da altura: «Na praia está Lísia - Lisboa - e o velho Tejo. E por cima, a voar, a felicidade eterna...»
Texto por Patrícia Cintra, Fotografias de José Sérgio - 12-12-2010
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Palácio Nacional da Ajuda
Largo da Ajuda, Lisboa
TEL. 213 637 095
das 10H às 17H
Encerra à 4.ª
www.pnajuda.imc-ip.pt
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