Não há muito a acrescentar a esta carta, enviada ao presidente da república, Manuel de Arriaga, em 1911. Apenas que podia ter sido escrita em 2010.
(Sublinhados nossos)
A vós me dirijo senhor, como chefe desta nação bem digna de melhor sorte!Fez ontem um ano que existe neste país a República e de então para cá só desenganos! Que dirão aqueles (como eu) que julgavam que em se mudando o regime, que haveria honestidade e liberdade! Puro engano!! Quem foi republicano convicto deve corar de vergonha e decerto não julgava que houvesse tanto heroi republicano de barriga. Se há ainda quem defenda a república é por capricho porque come à mesa do orçamento.Mas comei lobos famintos!Houve na verdade nos últimos anos da monarquia cenas escandalosas, mas decerto com o decorrer do tempo ao passo que a República com um ano de existência está ainda muito pior nos exemplos de administração.Para onde caminhamos?Pelas ruas não há respeito entre os elementos da classe civil. As autoridades não são respeitadas tudo é carbonários e voluntários!!! No exército não há disciplina e na marinha ainda pior; a organização do exército foi um saque à nação; só assim se explica como se promoveram capitães, com 2 anos de subalterno, como se o país necessitasse de tanto oficial que só serve para receber o salário e passear; como se não se soubesse que tudo isto é um cancro para o país e como a organização obedeceu simplesmente para promoções escandalosas etc etc.Haveria ordem se houvesse respeito.Haveria trabalho se o exemplo viesse de cima e os próprios ministros (do governo provisório) dessem o exemplo e não anexassem em altos cargos toda a Ex.ma família.Haveria Liberdade se cada um dicesse [sic] o que sente. O povo não estava convocado para a república e os grandes republicanos só tinham era inveja de não comer. Não tenho habilitações para melhor me exprimir, mas no intanto [sic] dá vor de gritar: aqui del-Rei!!Lisboa, 6/10/911
MATOS, Sérgio Campos, introd. e FREITAS, Joana Gaspar, colab. - Correspondência política de Manuel de Arriaga, volume I. Lisboa: Livros Horizonte, 2004, p. 371.
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